Ir para o sono se parece tanto com o modo como agora tenho de ir para a minha liberdade. Entregar-me ao que não entendo será pôr-me à beira do nada. Será ir apenas indo, e como uma cega perdida num campo. Essa coisa sobrenatural que é viver.

Nesse trecho do livro A paixão segundo G.H., a personagem fala sobre viver o presente, permitir-se atravessar o momento com abertura para o que tem a nos revelar aquilo que está fora de nós. Ela aponta, ainda, para a indeterminação que somos como seres humanos, pois podemos sempre ser afetados pelo mundo ao nosso redor e nos transformar, criando outras maneiras de ser e estar. A abordagem psicodramática considera a espontaneidade como potência de livre ação inerente ao ser humano, de modo que somos todos capazes de viver a experiência de presença, com os pés tateando o aqui e o agora, e desenvolver a criatividade para ampliar nossas possibilidades de expressão no mundo.

Esse estado de presença também está relacionado à palavra liberdade. Para pensarmos a nossa condição para a liberdade, precisamos considerar que somos seres sociais, atravessados por diversos fatores que nos situam em determinadas posições com relação a oportunidades, recursos e modelos de conduta. Nessa interface entre o individual e o coletivo, podemos refletir sobre como nos colocamos frente às limitações e inventar meios de alargar nossas possibilidades de ação para uma vida mais digna e autônoma. 

A psicoterapia psicodramática propicia que, de forma verbal ou por meio de um método de ação advindo do Teatro Espontâneo, a pessoa entre em contato com as cenas de sua vida em que se sente travada, em conflito ou desenergizada. Sendo ao mesmo tempo autor e ator de sua história, o indivíduo pode rever os scripts de sua vida e experimentar os diversos papéis que compõem a situação, olhando-se por diferentes perspectivas. Num ato de conjunta reflexão entre psicoterapeuta e cliente, pode-se observar facetas parciais, nuances e conflitos neste terreno múltiplo e complexo que é a vida, para então resgatar o potencial afetivo das relações, a presença ativa do indivíduo para pensar e experimentar formas de recriar aspectos insatisfatórios de si, de suas relações e da sociedade. Esse diálogo buscará o inédito, pois trabalha o desenvolvimento da espontaneidade e da criatividade para a invenção de novas formas de compor com a vida, favorecendo, assim, que vivamos o momento, lugar em que temos condição de agir e transformar.

Você não pode copiar conteúdo desta página